Na terça-feira (05), um terreiro de Umbanda em Cachoeira do Campo, distrito de Ouro Preto, denunciou um caso de suposta intolerância religiosa envolvendo a Polícia Militar e vizinhos. Um líder religioso foi detido e compartilhou a ocorrência em suas redes sociais. O jornal Galilé ouviu o Babalorixá Pedro e a Polícia, para tentar entender o que ocorreu na referida noite.
Relato do Babalorixá Pedro Gregório
O Babalorixá, ou pai-de-santo, do Terreiro de Umbanda Tenda de Ogum, Pedro Gregório, afirmou que a mudança de endereço da casa do terreiro, ocorrida na segunda-feira, precedeu os eventos da terça-feira. O terreiro retomou suas atividades de estudo religioso, e Pedro expressou preocupação quanto à possível reação dos vizinhos ao culto.
Segundo Gregório: “Eu pedi para que fôssemos pontuais para evitar qualquer problema porque eu não sabia como seria a recepção dos vizinhos com o nosso culto. Então iniciamos pontualmente às 20h como de costume, encerramos o estudo e fomos para a parte da ritualística. Na qual utilizamos dois atabaques, mas fizemos toques baixos e passados para evitar incômodo. Às 20:53h encerramos as atividades.”
O líder religioso relatou que, às 21h, a polícia chegou ao local, alegando uma denúncia de perturbação do sossego. A entrada abrupta dos policiais na residência, interrompendo as atividades religiosas, gerou revolta e tensão.
Nos vídeos compartilhados a reportagem, Pedro é chamado de ‘queixo duro’, em alusão uma suposta insubordinação. Em suas redes, ele trouxe partes dos registros daquela noite. O Babalorixá detalhou que, mesmo após constatar a inexistência de som no local, a polícia invadiu sua residência/terreiro, ordenando o encerramento das atividades religiosas. Diante da recusa, Pedro foi detido, acusado de desacato e perturbação de sossego.
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Resposta da Polícia Militar
Em resposta à denúncia, a Polícia Militar informou que foi acionada por uma moradora de 58 anos, vizinha do terreiro, que se queixava de perturbação do sossego. De acordo com as autoridades, a filha da mulher que registrou a ocorrência sofre de síndrome de Down. O Babalorixá, Pedro, foi encaminhado para assinar um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) e se comprometeu a comparecer em audiência no Juizado Especial Criminal da Comarca de Ouro Preto.
A PM afirmou que, segundo o Babalorixá, o culto havia iniciado às 20 horas e encerrado às 20h53min, sendo apenas uma palestra sem uso de microfones. A denúncia da vizinha mencionava a utilização de instrumentos de percussão em alto volume.
Veja a resposta completa:
“A Polícia Militar, foi acionada via 190 por uma mulher, 58 anos que alegava ser vítima de perturbação do sossego. O acionamento aconteceu em Cachoeira do Campo, na noite da última terça-feira, dia 05 de março. Segundo a vítima, um morador que se mudou recentemente para ao lado de sua residência, realiza cultos religiosos e que neste é usado instrumentos de percussão em alto volume e por ser cuidadora de seu cunhado portador de Sindrome de Down que devido ao barulho se agita e que há também na residência há um bebe recém-nascido. O autor, 27 anos, relatou aos policiais militares que havia realizado um culto aos orixás, denominado IFA e que o culto iniciara às 20 horas e encerrado às 20h53min, sendo apenas palestra sem uso de microfones. Foi constatado que havia cerca de 30 (trinta) pessoas no local do culto. O autor, que segundo informações estaria acompanhado de um advogado, assinou o Termo Circunstanciado de Ocorrência e se comprometeu a comparecer em audiência no Juizado Especial Criminal da Comarca de Ouro Preto a respeito dos fatos.”
Repercussão e Apoio
Pedro destacou que o terreiro recebeu mais apoio do que esperava, tanto de terreiros da região quanto de fora do estado. Amigos, familiares e membros da casa uniram-se para oferecer suporte ao Babalorixá. A comunidade permanece apreensiva quanto ao próximo encontro, marcado para a terça-feira seguinte.
O caso suscita discussões sobre respeito à diversidade religiosa e a necessidade de maior compreensão e tolerância entre diferentes práticas culturais e espirituais. Pedro também levantou a questão da falta de espaço e reconhecimento para as religiões de matriz africana em Ouro Preto, uma cidade que respira cultura negra.
“Ouro Preto é uma cidade que deveria estar cheia de terreiros amostra, com muito respeito à cultura e aos povos escravizados que padeceram aqui. Ouro Preto teve uma grande população courana (os negros de Arraial D’Ajudá) , e esses povos contribuíram para a forma como os terreiros de Umbanda e Quimbanda se organizam hoje no país todo. Mas tudo que é de religião de matriz africana é sufocado na região, no dia 23 de abril de 2022 fizemos uma passeata para Ogum e as pessoas pensaram que era o congado, justamente porque não há um espaço para as religiões de matriz africana que preservam a raíz de Makumb, tudo fica confundido com Congado ou movimentos similares que não são parte do Culto“, destacou o líder religioso.
O MPMG foi questionado sobre o caso, mas, até o fechamento desta matéria, não forneceu resposta. A comunidade do terreiro se mantém apreensiva quanto ao próximo encontro, marcado para a terça-feira seguinte.
O Galilé continuará acompanhando o desdobramento dessa denúncia e trará atualizações conforme disponibilidade.
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Jornalista formado pela Universidade Federal de Ouro Preto, com passagens por Esporte News Mundo, Blog 4-3-3 e Agência Primaz.