A batalha pela “Gerais”: Mariana segue sua vocação Hip Hop

A batalha pelas gerais: Mariana segue sua vocação Hip Hop

As duas igrejas se olham e observam centenas de jovens em Mariana observando um duelo de rimas. É a “Batalha das Gerais” dando o ar da graça e retornando após quase três anos de hiato. Há quem diga que a vocação de Mariana é a mineração, outros dizem que é o turismo histórico. Mas para a maioria dos presentes na Praça Minas Gerais na última sexta (14), a vocação da Primaz de Minas é o Hip Hop. Nas linhas de soco de um briga pelas idéias, destaca-se quem não comete a heresia de desvalorizar a palavra. Mas é preciso ser sagaz, levar o espírito de soldado dos morros dos inconfidentes. E por isso,esse sim é o glorioso retorno de quem nunca esteve aqui, ou já esteve e sempre buscou retornar.

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Não deve existir um local de disputa de sentido mais forte que a famosa Praça MG. No coração do lugar onde o estado foi embrionado, a história se impõe e coloca em voga temas como o passado escravagista, religião, política, turismo e agora novamente: a cena do rap. Entre 2015 e 2019, a Batalha era o grande ponto de encontro dos jovens da cidade. E de diversas localidades, tanto universitários quanto moradores de bairros mais afastados do centro histórico. Seja na Praça Gomes Freire ou no cruzamento das ruas Dom Silvério e São Francisco, a “BDG” se transformou em mais um monumento, desta vez urbano, da histórica cidade.

O campeão do retorno foi o garoto de 16 anos Keny, do Movimento TT1. Pedro Mol, ou Rich Braza, foi um dos dos fundadores da BDG, e não conseguia esconder a felicidade ao ver o retorno do evento. Ele mencionou com nostalgia que a primeira batalha aconteceu em março de 2015, em um canto específico onde o som era reproduzido por uma caixa de bateria e um microfone. Ele expressa nostalgia ao lembrar daquele momento e ressalta que desde o início, a batalha recebeu apoio de pessoas que se identificaram com o evento.

A estabilidade da batalha foi afetada por diversos motivos, como a pandemia, as mudanças políticas na cidade e a necessidade das pessoas de trabalharem. Apesar desses desafios, o coletivo responsável pela batalha está se reestruturando e buscando retornar com força. O rapper destaca que o evento não pertence a ele ou a nenhum indivíduo específico, mas sim à cidade de Mariana como um todo. Ele enfatiza a importância do apoio coletivo e da renovação de pessoas envolvidas no evento, que trazem conhecimento e energia nova.

“Temos um público mais jovem, uma mudança significativa, sabe? Estou vendo gente que nem conheço, mas todos compartilham a mesma ideia de oito anos atrás. Eles deixam seus bairros mais afastados e vêm para o centro. Não queremos ir para a Praça, queremos ir para a pista, nosso lugar aqui no centro histórico. É como a capoeira lá embaixo, nas sextas-feiras. Temos diversas outras atividades culturais que ocorrem no centro, e a batalha também já faz parte do calendário”, disse Pedro ao Galilé.

O retorno da BDG conta com o apoio da Prefeitura de Mariana, representada nesta sexta pelo secretário de Cultura, Lazer e Turismo Cristiano Vilas Boas, o procurador do município Juliano Barbosa e o Chefe da Comunicação Alex Bruno. Ao Galilé, Cristiano destaca a importância do dia para o movimento cultural da cidade. Para ele, o resgate da Batalha das Gerais é fundamental para a juventude local, que possui um público expressivo e é especialmente impactada pela iniciativa. Desde o início, a proposta da batalha era envolver os jovens da periferia de Mariana e fazer com que ocupassem o centro histórico, proporcionando-lhes um sentimento de pertencimento à cidade.

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“É um movimento muito interessante que eu já apoiava pessoalmente quando era vereador na Câmara de Mariana. Agora, à frente da Secretaria, fizemos questão de incluí-lo na programação do Festival de Inverno. Para marcar o retorno, estamos realizando a batalha no local onde ela se originou, na Praça Minas Gerais”, revelou Cristiano.

TERRITÓRIO DE DISPUTA E DIÁLOGO

Enquanto os MC’s se preparavam para batalhar e o público enchia as escadas da igreja São Francisco de Assis, acontecia uma novena em celebração da padroeira da cidade de Mariana, Nossa Senhora dão Carmo. Como numa metáfora de um Rap de Djonga, a Batalha aguardou o fim da eucarístia para começar o som. Mas sem nenhum tipo de confronto, a disputa ocorreu de maneira madura. O som só ligou após as portas da igreja se fecharem.

O rapper Caio Kinte, que se apresentou em um Pocket Show ao lado de Young $teve King, Acredita que a Batalha e disputa pelo espaço é algo forte, simbólico e significativo. Ele ressalta que esse sentimento se intensifica ao ver a presença de tantas pessoas no local. Caio menciona que a realização da Batalha das Gerais em Mariana faz o movimento de hip-hop pulsar na cidade. Ao olhar nos olhos de cada pessoa presente, ele percebe a pulsão da cultura, da arte, da religião e da política nelas. Esses elementos são parte integrante da cidade e de sua memória histórica, produzidos pelo coletivo que está presente ali.

“Quando pensamos em Mariana, não pensamos em um indivíduo isolado historicamente, mas sim em Mariana, a memória histórica, a cultura, tudo isso é produzido por um coletivo que está presente aqui hoje. Na maioria das vezes, esse coletivo é reprimido e expulso desse espaço. Então acho que a galera chega com o pensamento de ocupar esse espaço, de ocupar um espaço que tem uma significância antiga, histórica”

O Rapper DeSilva é outro “relíquia” que está presente desde os primeiros encontros. Ao Galilé ele destaca que foi uma luta política significativa poder reintegrar a juventude, que geralmente é marginalizada, ao centro histórico da cidade. Desilva enfatiza que a juventude periférica do hip-hop já é conhecida por ser um movimento social, e a Batalha das Gerais em Mariana é um momento de descontração e de os jovens colocarem seus talentos à prova. Ele destaca que muitos jovens presentes na batalha foram incentivados a ler e estudar devido à interação proporcionada pelo evento.

Organização da BDG. Foto: Igor Varejano

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“Aqui é um lugar onde se disputam os símbolos, onde se disputa o ambiente, e ver as pessoas vindo de suas localidades pra fazer hip-hop é muito massa, ô mano. Eu não vou cansar de falar não, mano. Essa é a nossa luta, mano, é empoderamento político, tá ligado? É algo que vai além da estética da batalha”, disse DeSilva ao Galilé.

Julia Siqueira, uma das organizadoras da Batalha das Gerais, expressa a esperança de que a batalha se estenda até o final do ano, além de ressaltar a importância de uma comunicação acessível com a prefeitura e o desejo de superar os preconceitos existentes para permitir que o movimento aconteça plenamente.

“É importante ressaltar que este é um lugar de disputas, onde as igrejas e a religião têm sua importância. Mas também é um lugar difícil de ocupar, onde é difícil dialogar com as pessoas. No entanto, eu não vamos desistir, vamos continuar aqui”, finalizou Julia.

A próxima edição da Batalha das Gerais de Mariana acontece no dia 28 de Julho, desta vez na Praça Gomes Freire, conhecida como Jardim. A intenção dos organizadores é continuar com a BDG a cada 15 dias até o final do ano.

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